Foi há três meses. Nas mãos cantavam-te esperanças e projectos e sobrava-te o riso abrindo alas à aventura.
Foi há três meses que fiquei envolta no cheiro a mosto da saudade, com um semblante de quem resiste nas margens do mundo e toda a esperança guardada num frasco transparente para se lembrar, fechado para não se volatilizar. O sofrimento é necessário para que a lembrança perdure, como me dizia a tua mãe quando lhe telefonava para me consolar .
Bem sei que não é muito tempo. Sobretudo se se estiver ao sol bebericando o sumo fresco de groselha. Mas nem sei porque me lembro de sol ou de groselha quando a chuva se assenhoria dos tempos e a groselha está ainda no caule aguardando a colheita e a tua sombra se apressou a ocupar o teu espaço na cama, enlanguescendo-se despudoradamente, alongando a noite.
A falta que senti do teu sorriso. O teu cheiro com olhos de erotismo, preso aos mais insuspeitados pedaços de existência. A solidão desgovernada, arrastando-me para programas de televisão que jamais quis ver.
Durmo desde então com o teu pijama enroscada no pensamento de que te tenho. Calcei as tuas pantufas, li os teus livros, mirei-me no teu espelho. Experimentei o chapéu que te deu a tua mãe quando saíste de casa, assente na cabeça como o pó do tempo. E como me fica bem,
E neste ritual de gestos em que me encontro contigo através de mim, apaixonei-me por nós. Depois, por mim. Por mim com o teu cheiro, o teu pijama, os teus livros e até com os teus horrorosos chinelos.
Faltam dois dias para regressares.
Não voltes!
Sou demasiado ciumenta para me partilhar contigo.
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